Mais velho que a profissão mais antiga do mundo: o puxa-saco
Cientistas confirmam a existência de parasitas que se proliferam no meio artístico
A sabedoria popular indica que a profissão mais antiga da história é aquela das mulheres de “vida fácil” (não sei de onde tiraram esse termo) ou seja: a prostituição. Um estudo da Universidade de Harvard derrubou o mito, transferindo para o cozinheiro o recorde de longevidade trabalhista.
Acredito que nenhuma das duas correntes têm a total razão. Para qualquer um desses profissionais, nos tempos mais remotos, vivia alguém que ganhava a vida, ou as benesses que ela pode proporcionar, apenas com o ofício de “puxar o saco”. Os reis da antiguidade costumavam respeitar os conselhos e palpites de seus bruxos, videntes ou curandeiros, abnegados colaboradores que estavam sempre a dizer exatamente aquilo que Vossa Alteza queria ouvir. A pena para um vacilo seria a forca, a guilhotina ou outra forma extremamente cruel de passagem antecipada para a outra vida.
O puxa-saco sobreviveu aos grandes desastres geológicos, cataclismas, erupções de vulcões, chuva de meteoros, sendo sempre um espécime em constante mutação, aperfeiçoando seu faro excepcional para conseguir os mais perfeitos hospedeiros. Alguns biólogos e cientistas acreditam que eles são mais resistentes que a barata. No Brasil, os primeiros exemplares vieram nas caravelas de Cabral e acharam aqui um habitat ímpar para desenvolver seus poderes e também para procriação da espécie.
Os intrusos se instalaram nos palácios de Imperadores e nobres da época, passando a integrar os altos escalões depois da independência da colônia e mais recentemente no alto clero de Brasília, governos estaduais, prefeituras ou assembleias legislativas espalhadas pelo país. Alguns tipos de puxa-sacos passaram a infestar repartições públicas e até empresas privadas, outros acharam um outro nicho interessante para seu negócio: a classe artística. Afinal, os sensores super–hiper-ultra desenvolvidos dos puxa-sacos detectaram uma fragilidade no que se refere ao gigantesco ego presente na maioria dos novos hospedeiros. O calcanhar de Aquiles estava lá, e não fugiu ao radar deles.
A evolução não para e agora a nova geração de puxa-sacos da classe artística pode ser vista como um tipo de personal alter ego, que não cria nada, não tem opinião formada sobre nada, não arrisca nada, porém fala tudo aquilo que o hospedeiro gosta de ouvir, como no tempo dos reis. São conhecidos cientificamente como Asponis artisticus.
Para ser um bom profissional do ramo, lembre-se que há muita concorrência. Não é fácil achar um hospedeiro que ainda não tenha sido atacado por um parasita. Se já há um parasita na parada, o trabalho será maior, você terá que exterminá-lo e depois ocupar o cobiçado lugar. Os puxa-sacos odeiam ter muito trabalho.
Quando o puxa-saco consegue o hospedeiro definitivo (é o grande objetivo, mas com um provisório o parasita já consegue engordar, principalmente a conta bancária, célula vital do seu avançado organismo), se aloja e começa a estudar as fraquezas da espécie invadida. Os primeiros meses são de estudo, movimentos lentos e planejados, para depois sugar os nutrientes de forma mais rápida. Afinal nunca se sabe quando outro parasita desesperado pode aparecer e disputar território.
O bom exemplar da espécie não fala muito, apenas o estritamente necessário. Quanto mais você fala, maior a probabilidade de entregar alguma verdade, fornecer uma pista sobre seu passado obscuro ou alguma opinião que esteja fora dos padrões do hospedeiro. Isso pode causar danos aos seus planos. De preferência, fique íntimo do seu anfitrião. Frequente a sua casa, pergunte sobre a família. Se ele bebe, tome alguns porres com ele, se fuma, passe a fumar compulsivamente. Elogie suas escolhas, seja uma camisa nova, carros, casas, barcos, etc. Deseje-lhe saúde, de preferência antes que ele espirre.
Nunca, nem sob tortura, dê alguma opinião (sobre quaisquer assuntos) antes de saber a dele. Pode ser fatal. Lembra-se da história da forca?
Se algo começar a dar errado, não tome nenhuma atitude precipitada. Artista perdoa (quase todas as vezes). Ache alguém para botar a culpa e você ainda tem bastante alimento para o próximo verão. Até lá você pode achar um hospedeiro melhor, acredite.
Um estudo recente mostra que um puxa-saco passa por vários hospedeiros ao longo da vida. Em alguns casos, não tão raros quanto nós mortais imaginamos, eles usam o mesmo hospedeiro por mais de uma vez.
Os hospedeiros por outro lado, não têm uma vida tão longa quanto os parasitas, na maioria das vezes. Historicamente, muitos definham depois de serem sugados por anos a fio, então acabam perdendo suas forças ($$$) após a vida compartilhada com um ou mais parasitas. Seus sonhos e objetivos morrem frequentemente bem antes que o puxa-saco consiga gastar a energia sugada (leia-se cifrão, mais uma vez) que tem acumulada e antes mesmo que ele encontre sua próxima vítima.
Carlos Guerra / Porteira Brasil Comunicação